A Polícia Federal disse em coletiva de imprensa que cumpriu 7 mandados de busca e apreensão na manhã de quarta-feira, em residências e gabinetes dos envolvidos. Novas investigações serão feitas e mais pessoas podem ser envolvidas
Polícia Federal e Ministério Público disseram que se a prefeitura não anular contrato com a Pavotec medidas judiciais serão tomadas
A Polícia Federal (PF) e o Ministério Público Federal (MPF) deflagraram na quarta-feira a segunda etapa da Operação Mar de Lama, que teve início no último dia 11. Esta segunda fase, que se concentrou praticamente em vereadores, surgiu em função da busca realizada na primeira fase, da qual foram coletados mais elementos de provas.
Desta vez, conforme números divulgados pela PF, foram cumpridos 7 mandados de busca e apreensão — todos em Valadares — e 6 ordens judiciais de afastamento de funções públicas. Desses 7 mandados, 6 aconteceram em residências de 5 vereadores, os quais foram afastados; um na residência de um gestor corporativo do Saae, que também foi afastado, e o outro no anexo da Câmara Municipal, nos gabinetes dos 5 vereadores afastados. Embora os nomes não tenham sido confirmados pela PF, já se sabe que são: Chiquinho (PSDB); o presidente da Casa, Adauto Carteiro (PROS); Leonardo Glória (PSD), atual líder de governo; José Iderlan (PPS); e o vereador Cabo Isá (PMN), que era suplente de Levi Vieira e havia tomado posse há cerca de 2 meses. O gestor do Saae seria José Afonso. Compilando dados, até o momento 26 agentes públicos e políticos foram afastados, sendo que 13 deles são vereadores.
Em entrevista coletiva à imprensa na manhã de ontem, o delegado da PF, Cristiano Campidelli, esclareceu que os nomes dos vereadores envolvidos constavam em uma espécie de planilha, com datas e valores que teriam sido recebidos por eles para votarem projetos em favor do Executivo Municipal para beneficiar empresas terceirizadas que prestam serviço ao município. “Segundo análises em materiais apreendidos durante a primeira fase da operação Mar de Lama, estes 5 vereadores e o gestor corporativo do Saae também recebiam vantagens indevidas em razão de suas funções para práticas de atos de ofício contrários ao interesse público. Os nomes deles foram encontrados em uma espécie de contabilidade de propina vinculados a valores e datas. Em razão disso, foi feita representação à Justiça Federal, com manifestação do Ministério Público Federal, razão pela qual a Justiça determinou estas buscas nestas datas e o afastamento destes vereadores e servidor. Em linhas gerais, esta é a fase 2 da operação, sendo que a gente teve um fato atípico, que não era objeto da operação diretamente. Com um dos envolvidos foram encontradas duas armas de fogo sem registro, razão pela qual foi lavrado um auto de prisão em flagrante e, por ser crime afiançável em sede policial, foi arbitrada fiança de R$ 10 mil, e tudo indica que ela será recolhida ainda na data de hoje. Vale lembrar que na fase 1 três alvos da operação também foram presos pelo mesmo motivo — posse irregular de arma de fogo”, revelou o delegado, referindo-se ao fato de que o Cabo Isá foi conduzido à sede da Polícia Federal ontem, onde permaneceu preso até o pagamento da fiança.
Pagamento de propinas
O procurador da República Felipe Valente Siman disse que existia um ponto no centro da cidade que funcionava como local de coleta de dinheiro e servia para pagamento das propinas. “A primeira fase da operação teve o objetivo de desarticular uma organização criminosa que estava instalada tanto na prefeitura quanto no Saae. A investigação revelou que os líderes desta organização criminosa estão diretamente envolvidos na administração da autarquia, sendo que o ponto de coleta de pagamento de propina, de distribuição dessas vantagens indevidas era em um ponto comercial no centro da cidade, que era também uma atividade desenvolvida por um dos diretores. Lá era um ponto de coleta, onde empresários se dirigiam para entregar dinheiro, e vereadores para receber os valores.” Felipe Siman não revelou que ponto seria este, mas informações não oficiais dão conta de que seria um posto de gasolina que pertence a Vilmar Rios, ex-diretor-ajunto do Saae, que cumpre prisão domiciliar por envolvimento na primeira fase da Operação Mar de Lama.
Os valores das propinas pagas mensalmente aos vereadores variavam entre R$ 2.600 e R$ 13 mil.
Anulação do contrato bilionário com a Pavotec
O MPF e a PF deixaram claro que se a prefeitura não anular por ato de ofício e de bom grado o contrato com a Pavotec, de quase R$ 1,5 bilhão, medidas judiciais serão tomadas. O contrato é referente a um processo licitatório que a empresa venceu para construção de um novo aterro sanitário e execução de serviços de limpeza urbana integrada, por meio da parceria público-privada, a chamada PPP. “Esperávamos uma postura diferente, porque aqui os órgãos federais estão demonstrando como as coisas estão sendo conduzidas nesta prefeitura. De fato, esperávamos uma postura muito contrária do que foi tomada; o contrato com a empresa Pavotec ainda está vigente, não foi feito nada para anular, e o Ministério Público vai agir para anular o contrato, caso a prefeitura não o faça”, assegurou o procurador.
O delegado Campidelli esclareceu que as investigações apontam para uma fraude e um direcionamento desse contrato para favorecer a Pavotec, acrescentando que o montante do desvio de dinheiro público é de R$ 4,7 milhões. “O que foi dito pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal é que existem fraudes em contratos que, juntos, superam o valor de R$ 1,5 bilhão; foi dito também que dos R$ 4,7 milhões inicialmente investigados de recursos da união por conta da catástrofe provocada pelas chuvas de 2013 é que foram destinados apenas 20% do valor à população; os 80% foram desviados, e este recurso, inclusive, fomentou vida de luxo, viagens a paraísos e compra de carro de luxo. Não houve desvio do contrato bilionário e nem haverá, não porque a prefeitura esteja fazendo o trabalho dela de correção destes atos administrativos fraudados nem por méritos do Executivo, mas eles não foram desviados e não serão porque todas essas fraudes foram descobertas durante sua feitura. Durante a investigação da fraude dos contratos das 8 dispensas de licitação — inicialmente R$ 4 milhões de recursos da União, posteriormente alguns milhões de recursos do município — a Polícia Federal descobriu outros 3 contratos fraudulentos, um destes deles é este bilionário. Então, as investigações de todo este contrato e de toda a concorrência pública foi integralmente direcionada e fraudada por servidores da prefeitura que fizeram o edital dentro da empresa favorecida, e eles já falavam muito antes do edital ser publicado que a licitação seria da empresa tal. E a gente espera o mínimo do poder Executivo: que anule de ofício estes atos para que a gente não tenha que recorrer ao Judiciário. Até o presente momento não aportou na Polícia Federal nenhum ofício da prefeita pedindo cópias das investigações para que tomem as medidas cabíveis, e é o mínimo que se espera de um governante.”
Explicações
Em nota, a prefeitura se pronunciou afirmando que apoia as investigações e que o contrato foi suspenso. “A administração municipal esclarece que assim que foi deflagrada a operação da Polícia Federal, no dia 11 de abril, a prefeita Elisa Costa imediatamente determinou que fossem exonerados os servidores afastados e fosse aberta sindicância/processo administrativo para apurar os fatos investigados, o que já foi feito. É importante ressaltar que a abertura de processo administrativo diz respeito exatamente à apuração de irregularidades nos contratos que estão sob investigação. Também por determinação da prefeita, foram adotados procedimentos para suspensão do contrato de R$ 1.483.726.580,32 referentes à concorrência pública para implantação do aterro sanitário do município até que se concluam as investigações, assim como o outro contrato que não tenha sido executado. Ressalta-se ainda que há o integral apoio desta administração a todas as ações que, responsavelmente, visam ao combate a quaisquer atos ilícitos no âmbito da administração pública e que, para tanto, tem colaborado com as investigações”, concluiu a nota da Secretaria Municipal de Comunicação e Mobilização Social (Secom).
Em relação à situação da Câmara, dos vereadores afastados, do pagamento dos salários e da convocação dos suplentes, o procurador-geral da Câmara Municipal, Douglas Coutinho, disse que tudo está sendo analisado. “Para respondermos estas perguntas temos que fazer uma análise dos fatos até agora. Tivemos algumas atitudes tomadas pelo juiz federal e elas ainda estão repercutindo, tanto que tivemos mais repercussão no dia de hoje [ontem]. A Câmara Municipal pode recorrer da decisão do juiz, mas a situação está sendo analisada. A priori, vamos ver o impacto disso, principalmente no orçamento da Câmara.”
Nenhum dos vereadores foi encontrado para falar, e nenhuma das assessorias dos se pronunciou neste primeiro momento, mas devem fazê-lo posteriormente. A Pavotec — Pavimentação e Terraplanagem, responsável pelos serviços de limpeza urbana, também não enviou resposta porque, apesar das tentativas, não foi possível manter contato.
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